Em tempos de crise, quando indústria e comércio esperam queda nas suas respectivas receitas, torna-se essencial a busca por soluções que reduzam os custos fixos do negócio e garantam sua sustentabilidade no curto e no médio prazos. Energia elétrica é um dos principais custos para vários negócios, sobretudo para a indústria dos mais variados setores, e deve ser tratada com atenção. Felizmente, é um tema com diversas alternativas e oportunidades, acessíveis a qualquer ramo de atividade e porte de empresa, podendo, inclusive, se tornar um diferencial competitivo para quem assumir uma postura ativa na gestão de energia.

A começar pelo Mercado Livre de Energia (MLE), alternativa que conta com a adesão de mais da metade dos consumidores com demanda contratada acima dos 500kW no país e que consiste na liberdade de escolher o fornecedor de energia que apresentar a melhor condição para o consumidor, , independentemente da tarifa da distribuidora local. A autonomia em negociar preço, volume, tempo de contrato, forma de reajuste, dentre outras condições, difundiu a alternativa no Brasil. No começo dos anos 2000, a migração para o MLE era restrita a consumidores com demanda superior a 3000 kW, sofrendo uma abertura gradual para os atuais 500kW. Ampliar o acesso a essa alternativa é um dos pilares do marco do setor elétrico, que está em vias de aprovação aqui, possibilitando, por exemplo, que pequenas indústrias (demanda menores que 500 kW) possam aderir a esse mercado dentro de poucos anos, como já acontece em muitos outros países. O MLE, por ser um projeto predominantemente contábil, ou seja, que não necessita de investimentos físicos relevantes (somente a adaptação do sistema de medição), somado à possibilidade de adquirir energia com preços que possam resultar em economia superior a 30%, torna-se perfeitamente adequado ao momento atual da economia. Em 2016, tivemos o chamado “boom” de migrações para o MLE, resultado da elevação histórica de preços no mercado regulado (tarifa de energia das distribuidoras). A queda expressiva no consumo do país, somado ao volume de chuvas favorável que tivemos neste início de ano, o preço de energia no Mercado Livre de Energia é um dos menores historicamente, criando um ambiente altamente atrativo para migração. 

Considerando que não basta negociar bem a compra do insumo, as ações de eficiência energética (AEEs) são aliadas importantes no combate ao desperdício de energia em instalações industriais. Conceitualmente, as AEEs objetivam garantir os mesmos níveis de qualidade em uma determinada atividade, porém demandando um volume menor de recursos energéticos e, consequentemente, financeiros. As AEEs podem ser desenvolvidas em diferentes patamares de complexidade, compreendendo desde pequenas ações de conservação de energia (como o desligar das luzes ao sair de um ambiente e a reprogramação de rotinas de operação de máquinas) até ações estruturais (como a substituição de equipamentos ineficientes e investimentos em sistemas de automação e gestão de insumos). Ainda há de se destacar que os modelos de negócio disponíveis para o desenvolvimento de projetos de eficiência energética na indústria já foram exaustivamente testados e contam com o incentivo e o interesse de diferentes provedores de recursos financeiros, que usualmente objetivam a formatação de contratos de performance (em que a remuneração da empresa executora é baseada no sucesso das ações realizadas).

Outra modalidade que tem ganhado adeptos em todas as classes de consumo no Brasil é aquela em que o consumidor gera, produz a sua própria energia elétrica, que, nos termos do setor elétrico, representa a micro e minigeração distribuída (GD). Instituída pela Regulação Normativa 482/2012 da ANEEL, esta modalidade permite que qualquer consumidor de energia elétrica tenha a liberdade de instalar pequenas unidades de geração de energia elétrica renovável (solar, eólica, biomassa, hídrica ou cogeração), aproveitando-se da energia por ela gerada e, em caso de excedentes (geração maior que o consumo), usufruir de créditos energéticos contabilizados pela distribuidora local por um período de até 60 meses (vale ressaltar que consumidores conectados em baixa tensão/BT apresentam maior viabilidade econômica, pelo fato de pagarem tarifas mais altas). Além do formato tradicional, em que o empresário pode adquirir os equipamentos para construir sua própria usina de geração, um modelo de negócios que tem ganhado um número crescente de adeptos é o da “locação de usinas, potencializado por investidores interessados em contratos de longo prazo que, em contrapartida, ofertam descontos às empresas contratantes (frente às tarifas de energia aplicadas pelas distribuidoras). Ao mesmo tempo em que a indústria passa a usufruir de uma matriz energética renovável (em seu nome), também usufrui de ganhos financeiros no longo prazo. Este modelo de locação, contudo, demanda uma análise minuciosa acerca da viabilidade econômica, técnica, contratual e regulatória da operação, sendo recomendável que o consumidor (a indústria/a empresa) conte com o auxílio de uma consultoria especializada. O modelo de locação de usinas tem sido largamente desenvolvido, inclusive em empresas consumidoras de energia com múltiplas unidades consumidoras (em uma mesma área de concessão – distribuidora), majoritariamente conectadas em Baixa Tensão/BT.

Além das opções já consolidadas disponíveis no mercado, é importante olhar com atenção para as novas tecnologias e as soluções em desenvolvimento, que já são realidade em outros países e que no Brasil requerem tão somente algumas adaptações regulatórias e tributárias para a elaboração de modelos de negócios sustentáveis. Um exemplo interessante é o de sistemas de armazenamento de energia (BESS, na sigla em inglês), liderados pelas baterias eletroquímicas, que vêm ganhando espaço devido à queda de preços observada nos últimos anos (que deve ser ainda mais acentuada ao longo desta década). Esses sistemas de armazenamento, além de permitirem a chamada arbitragem (armazenar energia quando seu preço está baixo para utilizá-la quando seu preço está alto, o que é mais comum quando se trabalha com preços horários de energia), agregam muitos outros benefícios em termos de qualidade de energia e segurança para a rede elétrica da indústria. Vale ainda citar soluções inovadoras que se utilizam de inteligência artificial, internet das coisas (IoT, na sigla em inglês) e computação em nuvem, que são os pilares da chamada Indústria 4.0. Este conceito tem originado soluções impressionantes em medição inteligente de insumos, gestão de operações e otimização de produção, tudo isso levando em consideração a minimização do uso dos recursos energéticos. Já é possível encontrarmos empresas brasileiras com modelos de negócios interessantes para o desenvolvimento de projetos inovadores.

É imprescindível que as alternativas citadas sejam avaliadas de forma conjunta, considerando as características particulares de cada indústria. Por exemplo, a migração para o Mercado Livre de Energia deve ser conduzida de forma a se potencializar a viabilidade econômica de projetos de eficiência energética, uma vez que a redução do preço da energia elétrica interfere diretamente na valoração dos ganhos alcançados com a redução do consumo. Analogamente, o desenvolvimento de projetos de Geração Distribuída deve ser observado sob a ótica regulatória com cuidado, uma vez que se trata de uma opção exclusiva para o mercado cativo (empresas que consomem e pagam pela energia diretamente à distribuidora local) – caso a indústria esteja no Mercado Livre de Energia, outras alternativas regulatórias devem ser exploradas. E mais: as ações para reduções de custos com energia têm caráter contínuo, o que demanda um acompanhamento sistemático do ambiente energético interno da indústria (processos, insumos, etc.), bem como do ambiente externo do setor (regulação, preços de energia, custos de equipamentos, etc.). Assim, recomenda-se a capacitação de profissionais e a contratação de empresas de gestão, de modo a garantir resultados de longo prazo.

Resumidamente: o Mercado Livre de Energia e a Geração Distribuída reduzem o custo de sua tarifa de energia, e a Eficiência Energética reduz o consumo efetivo. Aliados importantes para o atual momento e imprescindíveis para qualquer empresa. 


Leonardo Granada Prime Energy

 

Leonardo Granada Midea é Sócio-Diretor na Prime Energy, engenheiro eletricista e Mestre em Energia formado pela Escola Politécnica da USP, trabalhou em grandes grupos como Grupo Pão de Açúcar, Grupo Votorantim, Grupo Energisa, e em 2010 fundou a Prime Energy.