A política tarifária norte-americana, marcada pelo famigerado tarifaço, tem trazido à tona uma série de desafios para o Brasil e até mesmo incertezas para o comércio global.

Este assunto foi o cerne da Palestra Magna ‘EUA, a Geopolítica e o Brasil nesse novo cenário’. Ela aconteceu no 10º Congresso Brasileiro da Indústria de Máquinas e Equipamentos, organizado pela Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ).

O portal A Voz da Indústria acompanhou o respectivo painel, que reuniu Alberto Pfeifer, da ESEM-USP, Sergio Vale, da MB Associados e Thiago Aragão, da Arko Affairs, com mediação de José Velloso, presidente executivo da ABIMAQ.

Cada especialista apresentou uma perspectiva sobre o impacto do tarifaço, as mudanças no equilíbrio geopolítico e as oportunidades e riscos nacionais no cenário internacional. Acompanhe abaixo.

Geopolítica: qual é o lugar do Brasil no mundo?

Para Alberto Pfeifer, compreender a geopolítica é entender também a geografia em sua dimensão expandida. Ele destacou que a China tem aumentado o seu interesse no continente antártico e que o Brasil, pela proximidade, ocupa uma posição estratégica.

Alberto ainda lembrou que 26% da população brasileira vive sob esquemas do crime organizado, o que coloca a segurança como elemento central na análise geopolítica. Segundo o especialista, o Brasil tornou-se um território de cobiça, tanto por seus recursos naturais quanto pela presença de organizações criminosas transnacionais. “Tudo culmina na geopolítica”, esclareceu.

Na ocasião, ele compartilhou que o tarifaço dos Estados Unidos não deve ser visto apenas como uma medida comercial, mas como parte de um jogo geopolítico global, cujo Brasil é a peça-chave. “O Brasil está no centro desse jogo”.

Ou seja, a reorganização unilateral norte-americana exige que o setor privado brasileiro ganhe protagonismo, de modo a aproveitar o interesse das duas maiores potências do mundo, EUA e China. “Temos que pensar no longo prazo”, alertou.

A economia global em transição

Por sua vez, Sergio apresentou um diagnóstico econômico sobre o tema da palestra. Ele contextualizou que, após a hegemonia britânica e, depois, americana, hoje vivemos num cenário de disputa direta entre EUA e China.

De acordo com Sergio, mudanças desse porte trazem períodos de instabilidade e volatilidade econômica. “Se olharmos num histórico de 200 anos, teremos sempre um indicador de poder global”.

Por sinal, o tempo presente mostra que nos EUA o quadro não é tão animador, conforme explicou o palestrante. “O país acumula uma dívida pública de 100% do PIB”. Além disso, enfrenta uma forte polarização política e projeta crescimento modesto, em torno de 2% e 3% ao ano.

Tal ambiente, segundo Sergio, pressiona os juros, enfraquece o dólar e amplia os riscos para a economia mundial. Reflexos que, a propósito, podem ser sentidos no Brasil.

Com relação a indústria brasileira, foi detalhado que o impacto imediato do tarifaço é ainda limitado. Porém, novas rodadas de tarifas podem surgir. Além do mais, o Brasil deve se preparar para um cenário de juros elevados até, pelo menos, 2027, com pressões cambiais e inflacionárias persistentes.

O economista destacou que, apesar dessas informações, a matriz energética limpa do Brasil, por exemplo, é um diferencial positivo, entre tantos outros, que, diante do enfraquecimento americano, dá espaço ao Brasil no tabuleiro internacional.

“O Brasil não melhorou, mas o mundo piorou. E isso pode ser positivo. Hoje, somos olhados de igual para igual.”

EUA e China: os reflexos dessa disputa para o Brasil

Já Thiago centrou a sua análise no impacto direto da disputa entre EUA e China. Para ele, a indústria brasileira encontra-se encurralada entre as tarifas impostas pelo presidente Donald Trump e a competição chinesa.

Ainda de acordo com o especialista, a estratégia norte-americana carece de coesão, porque enquanto o país busca atrair indústrias para o seu território, tenta enfraquecer a capacidade da China. “Porém, de forma contraditória e fragmentada”, comentou.

A China, no entanto, tem atuado com pragmatismo, ampliando a sua influência na América Latina por meio de linhas de crédito e zonas especiais de produção. Tudo, segundo Thiago, em uma lógica de mercado voltada não apenas ao lucro, mas ao market share.

Outro ponto de destaque na fala de Thiago no painel da ABIMAQ foi com relação a uma certa urgência dos EUA em negociar com o Brasil, uma vez que trata-se do maior país entre os “menos relevantes” em termos comerciais, porque detém recursos estratégicos, como os minerais raros.

Ou seja, o tarifaço norte-americano é apenas um dos elementos de um cenário mais amplo, cuja importância estratégica do Brasil pode ser crescente.

Para a indústria brasileira, a mensagem é clara: o país está no centro de um jogo global e precisa adotar uma postura ativa, de modo a explorar as suas vantagens estratégicas para transformar riscos em oportunidades.

10° Congresso Brasileiro da Indústria de Máquinas e Equipamentos

Assista a gravação do evento na íntegra!