Quando o assunto é transformação digital na indústria, é importante entender a maturidade tecnológica. A adoção das tecnologias viabiliza maior produtividade e mais oportunidades de negócio, mas o desafio de implementação e adoção, além da própria conectividade no Brasil, podem ser impeditivos. 

Periodicamente, a TOTVS mede o Índice de Produtividade Tecnológica (IPT), incluindo o setor de Manufatura e seus principais nichos. 

Durante o Universo TOTVS, evento realizado em São Paulo nos dias 17 e 18 de junho, A Voz da Indústria entrevistou Angela Gheller, diretora de produtos para Manufatura na TOTVS. 

A seguir, confira o bate-papo que passou por panorama da indústria nacional, inteligência artificial e mais tecnologias habilitadoras, desafios, oportunidades de crescimento e soluções possíveis. 

A Voz da Indústria: Como está o cenário atual da digitalização na indústria brasileira? 

Angela Gheller: A indústria brasileira está em uma jornada importante de transformação digital. Desde 2019, temos acompanhado essa evolução através do nosso Índice de Produtividade TOTVS (IPT). Naquele ano, o índice estava em apenas 0,52 em uma escala de 0 a 1, com cerca de 80% das empresas nos dois quartis inferiores. Na pesquisa mais recente, já vimos um avanço significativo, com o índice subindo para 0,71, e mais de 80% das empresas no segundo quartil. A pandemia acelerou muito esse processo, forçando muitas empresas a buscarem soluções digitais rapidamente. 

Angela Gheller, diretora de produtos para Manufatura TOTVS – Crédito: Divulgação

A VDI: Qual é o perfil das empresas que participaram desse estudo? 

Angela Gheller: Entrevistamos mais de 500 empresas, sendo 42% pequenas empresas, 40% médias e 13% grandes empresas. Isso nos deu uma visão bastante abrangente do mercado industrial brasileiro. 

AVDI: E como está a adoção de tecnologias específicas para o chão de fábrica? 

Angela Gheller: Ainda temos muito a avançar nessa área. Na pesquisa do ano passado, apenas 18% das empresas usavam sistemas de planejamento avançado de produção (APS) e somente 30% implementaram sistemas de execução de manufatura (MES) para coleta automática de dados das máquinas. A manufatura é realmente o segmento mais tradicional. Mesmo para soluções que não chegam ao nível de inteligência artificial, como um ERP básico, não temos uma utilização ampla pelas empresas. 

AVDI: Como a inteligência artificial se encaixa nesse cenário de digitalização ainda em desenvolvimento? 

Angela Gheller: Esse é um ponto crucial. Precisamos de dados digitalizados para pensar em inteligência artificial. Não há como implementar IA efetivamente sem ter uma base digital sólida. Hoje, as empresas estão abertas para a inteligência artificial, especialmente com o desenvolvimento da IA generativa, mas ainda há muito desconhecimento. Mesmo os executivos que lideram as empresas frequentemente fazem perguntas muito básicas sobre IA, querendo resolver problemas sem identificar claramente quais são esses problemas. 

AVDI: Quais são as principais preocupações na implementação da IA na indústria? 

Angela Gheller: A segurança dos dados é uma preocupação fundamental. Precisamos definir quem pode fazer perguntas ao sistema e quais dados podem ser acessados por cada perfil de usuário. Em um ambiente industrial, há informações sensíveis do chão de fábrica que não devem estar disponíveis para todos. Também é importante garantir que o aprendizado dos algoritmos ocorra de forma segura. Na TOTVS, desenvolvemos soluções que permitem que o algoritmo aprenda com os dados da empresa sem expô-los externamente. 

AVDI: Existe um temor sobre o impacto da IA nos empregos industriais. Como você vê essa questão? 

Angela Gheller: Esse receio é natural com qualquer tecnologia disruptiva. Mas não se trata de eliminar empregos, e sim de transformar a forma como trabalhamos. As pessoas vão trabalhar de forma diferente, com foco em valores diferentes. Acredito que estamos abrindo um mundo de possibilidades que não tínhamos antes. Comparo essa transição ao surgimento dos smartphones entre 2008-2009, que inicialmente geraram apreensão, mas acabaram criando inúmeras oportunidades e transformando positivamente diversos setores. As pessoas que hoje trabalham no operacional terão oportunidades de atuar em outras áreas, com foco em melhorias e inovação, não apenas no transacional. 

AVDI: Em que estágio você diria que está a indústria brasileira em relação à Indústria 4.0? 

Angela Gheller: Estamos ainda caminhando para uma indústria 4.0. A digitalização no Brasil ainda é muito baixa, mas vejo um aspecto positivo: todas as empresas que acompanhamos há tempos estão passando por uma mudança de cultura, impulsionada pela pandemia e pela revolução da inteligência artificial. As empresas estão discutindo essas questões e procurando como implementá-las. Há desafios culturais e problemas internos, mas vejo uma disposição que antes não existia. A indústria hoje tem outra maturidade e outra visão do que precisa fazer, porque é pressionada por todos os lados. 

AVDI: Quais setores industriais você acredita que estão mais avançados na adoção de IA? 

Angela Gheller: Os setores de consumo já têm bastante coisa implementada, como a indústria de alimentos e a produção de equipamentos mais pesados. A indústria automotiva também se destacou, tendo se automatizado muito antes que as outras. Essas empresas saem na frente pela necessidade de produzir mais com menos, pensando em produtividade e custo. Mas entendo que toda a manufatura terá ganhos muito grandes, não apenas na linha de produção, mas também nas áreas de vendas, marketing, logística interna e em toda a aplicação da inteligência artificial. 

AVDI: Para finalizar, qual mensagem você deixaria para as indústrias que estão iniciando sua jornada de transformação digital? 

Angela Gheller: Estamos olhando o segmento de manufatura ainda engatinhando na digitalização. Já avançamos bastante, mas ainda há muito a fazer. A inteligência artificial vai trazer o amadurecimento que falta na digitalização, oferecendo facilidades para as empresas alcançarem um novo nível de maturidade. É importante que as empresas identifiquem claramente os problemas que desejam resolver, invistam na digitalização básica e preparem suas equipes para essa nova forma de trabalhar. A transformação é inevitável, e aqueles que se adaptarem mais rapidamente colherão os maiores benefícios em termos de produtividade e competitividade. 


Durante o evento Universo TOTVS, diversas soluções e aplicativos para o setor de manufatura estão em demonstração. Continue acompanhando A Voz da Indústria para conhecer alguns dos destaques da programação.